Prezado,Boa tarde!Sou estudante de direito e nesta tarde deparei-me com a situação em comento, em busca de decisões dos tribunais acerca do assunto em tela, encontrei uma decisão que acredito ser de grande aproveito.Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Mandado de Segurança n. 2007.062597-5, de Capital
Relator: Des. Pedro Manoel Abreu
Mandado de Segurança. Concurso Público. Candidato portador de perda auditiva neurossensorial unilateral. Perícia médica. Exclusão deste, do certame, ao argumento de que só são considerados portadores de necessidades especiais os que apresentem perda auditiva neurossensorial bilateral. Ilegalidade. Precedentes do STJ (RMS n. 20865/ES). Segurança concedida.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Mandado de Segurança n. 2007.062597-5, da comarca de Capital (Tribunal de Justiça), em que é impetrante Emilson da Silva Medeiros e impetrado Secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão e outro:
ACORDAM, em Grupo de Câmaras de Direito Público, à unanimidade, conceder definitivamente a segurança.
RELATÓRIO
Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado por Emilson da Silva Medeiros contra ato do Secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão e do Delegado Chefe da Polícia Civil do Estado de Santa Catarina, responsáveis pelo Edital n. 005/2005, relativo ao Concurso Público da Secretaria de Segurança Pública e Defesa do Cidadão.
Disse o impetrante ter efetivado inscrição no referido Concurso Público, regido pelo Edital n. 005/2005, para o cargo de investigador policial, na condição de portador de necessidade especial, pois acometido de perda auditiva neurossensorial unilateral, classificados no CID sob o n. 10 H-90.7.
Argumentou que, convocado a submeter-se à prova objetiva, obteve a 17.ª classificação entre as vagas oferecidas aos candidatos portadores de necessidades especiais.
Afirmou, nessa linha, que em 12.02.2006 foi submetido à segunda etapa do certame – prova de capacidade física, de caráter eliminatório - classificando-se na 10.ª posição consoante o relatório da Portaria n. 133/GAB/CPC/SSP/2006.
Ressaltou que, nos dias 23 e 24 de fevereiro de 2006, após a realização daquela etapa, foi convocado para a efetivação de matrícula no Curso de Formação da Academia de Polícia do Estado de Santa Catarina – ACADEPOL. Matriculado na condição de portador de necessidade especial, iniciou o Curso em 1.3.2006, juntamente com os demais candidatos convocados.
Entretanto, verberou, após estar cursando a ACADEPOL por um período de três meses, foi submetido à perícia médica para avaliação de sua condição de candidato portador de necessidade especial. Gizou que essa conduta contrariou o disposto no item 2.3.3.9 do Edital, que prevê a realização de perícia médica quando da convocação para o curso de formação profissional.
A nova perícia realizada concluiu, disse novamente, que a necessidade especial de perda auditiva neurossensorial unilateral, CID-10 H90.7, não se enquadra dentro dos parâmetros legais. Porém, afirmou que tal resultado foi obtido por um simples questionário fornecido ao candidato sem que, contudo, tivesse sido realizado com ele qualquer exame clínico. Registrou que de um dos ouvidos possui audição de 100% (cem por cento).
Sublinhou que, não obstante a ilegalidade praticada, em data de 1.10.2007, foi convocado novamente pela Secretaria de Segurança Pública para avaliação pericial, realizada pelo CONEDE – Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, o qual teria informado que a sua deficiência não configura necessidade especial.
Por fim, disse que o laudo elaborado pelo CONEDE apontou como apto, na condição de deficiente, outro candidato de nome Valmor Fachini Cegala Júnior, a quem foi atribuído o mesmo diagnóstico do impetrante: perda auditiva neurosensorial unilateral – CID 10 H 90.7.
Insurgiu-se assim contra laudo técnico elaborado pelo citado Conselho, emitido em 2.10.2007, em que, após avaliação superficial, concluiu que aquele não se enquadrava dentro dos parâmetros previstos na Lei Estadual n. 12.870, de 12.1.2004, por ser portador de perda auditiva neurossensorial unilateral – CID-10 H-90.7.
Informa que o seu pedido visa à efetiva e legal aplicação dos critérios estabelecidos pelo Edital n. 005/2005, concernente ao Concurso Público da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Santa Catarina, bem como ao cumprimento do art. 37, VIII da Constituição Federal e das Leis Estaduais n. 9.899/95, n. 12.870/04 e Decreto n. 3.298/99.
Ao final, requereu a concessão de liminar para reconhecê-lo como portador de necessidades especiais, medida esta que foi deferida em decisão da lavra da eminente Desembargadora Sônia Maria Schmitz (fl. 93), após a manifestação das autoridades ditas coatoras. Pugnou, por derradeiro, pela sua imediata nomeação e posse no cargo de Investigador Policial referente ao Edital n. 005/2005 ou, sucessivamente, submetido a outra perícia médica com exames clínicos.
Nas informações, suscitaram as autoridades impetradas preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, porquanto o impetrante requereu a sua imediata nomeação e posse, ato que somente poderia ser realizado pelo Chefe do Poder Executivo Estadual, inexistindo qualquer delegação nesse sentido aos impetrados. No mérito, reafirmaram que a perda auditiva neurossensorial unilateral não se enquadra entre os que devem ser beneficiados com as vagas destinadas aos portadores de deficiência. Ressaltaram que o Candidato Valmor Fachini Cegala Júnior possui perda auditiva neurossensorial bilateral, moléstia diversa da que acomete o impetrante. Gizaram ter havido erro de digitação, comprovado pelos documentos de fls. 87-88. Por isso, entenderam inexistir direito líquido e certo a defender. Requereram, ao final, a extinção do feito sem resolução de mérito nos termos do art. 267, VI, do CPC, ou, alternativamente, a denegação da segurança.
A douta Procuradoria Geral de Justiça, instada, manifestou-se pela concessão definitiva do pedido.
VOTO
As autoridades impetradas argüiram preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, uma vez que o impetrante pleiteia sua nomeação e posse, ato este de competência do Chefe do Executivo Estadual, ausente, no caso concreto, qualquer delegação nesse sentido.
Não lhes assiste razão.
Como bem ressaltou a Procuradoria Geral de Justiça, o ato ilegal combatido no writ é o acatamento, pelo Secretário de Segurança Pública e Cidadania e pelo Delegado Geral da Polícia Civil, da avaliação médico-pericial subscrita pelos membros do CONEDE, cuja conclusão foi no sentido de não enquadrar o impetrante como candidato portador de necessidades especiais. In casu, estas são, efetivamente, as autoridades públicas responsáveis pelo ato administrativo e pela sua revisão. A posse e a nomeação são apenas os possíveis efeitos, corolários do pedido liminar, caso confirmados ao final.
Processo civil. Administrativo. Mandado de segurança. Ilegitimidade passiva. Inocorrência. Concurso público. Edital nº 001/93. Agente da Polícia Federal. Decadência. Art. 18 da Lei nº 1.533/51. Extinção.
1. No mandado de segurança, a legitimidade da autoridade é definida na pessoa que pratica ou ordena concreta e especificamente a execução ou inexecução do ato impugnado. Tratando-se, no caso concreto, de portaria ministerial, a autoridade apontada como coatora é parte legítima.
2. Não há que se falar em ato omissivo contínuo quando aberto novo concurso, porque caracterizado ato concreto da Administração na recusa dos candidatos remanescentes do certame anterior, iniciando-se dessa data a contagem do prazo decadencial.
3. Aplicação do art. 18 da Lei nº 1.533/51.
4. Extinção da ação mandamental (STJ, MS 8461/DF, rel. Min. Paulo Gallotti, j. 11.12.2002).
Por essa razão, afasta-se a preliminar suscitada. No mérito, razão assiste ao impetrante.
Combate ele ato dos impetrados que, após terem admitido a sua classificação para o Curso de Formação Profissional da ACADEPOL, realizaram perícia médica que constatou não se enquadrar entre os candidatos portadores de necessidades especiais, uma vez que a perda auditiva só lhe atinge um dos ouvidos.
Não há nos autos, combate ao quadro clínico do impetrante. A celeuma, neste aspecto, é exclusivamente de direito, isto é, demanda apenas verificar se se enquadra ou não ele entre os candidatos considerados agraciados pela reserva de vaga.
O tema é regrado na Lei Estadual n. 12.870/04, que em seu art. 4.º, inciso II, conceitua e identifica os indivíduos portadores de necessidades especiais. Consta no texto legal:
Art. 4.º - É considerada pessoa portadora de necessidades especiais a que se enquadra nas seguintes categorias:
(...) omissis.
II – deficiência auditiva – perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, variando de graus e níveis na forma seguinte:
a) de 25 a 40 decibéis – db – surdez leve;
b) de 41 a 55 – db – surdez moderada;
c) de 56 a 70 – db – surdez acentuada;
d) de 71 a 90 – db – surdez severa;
e) acima de 91 – db – surdez profunda; e
f) anacusia;
Não consta no dispositivo legal em tela a alegada restrição feita pela autoridade pública. Vale dizer, a Lei de regência não excepciona a surdez unilateral do rol de necessidades especiais. Aliás, ao contrário, a norma menciona "perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras", o que faz enquadrar o impetrante dentro do permissivo da Lei.
Tampouco existe vedação no Edital. Veja-se, a este respeito, o item 2.3.3.7:
O candidato portador de necessidades especiais, resguardadas as condições previstas na Lei Estadual n. 12.870/04, participará do Concurso em igualdade de condições com os demais candidatos, no que concerne ao conteúdo da prova, à avaliação e aos critérios de aprovação, ao horário e local de aplicação da prova e à nota mínima exigida para todos os demais candidatos.
Ora, se a Lei n. 12.870/04 e o Edital não contém amparo legal para a exclusão do impetrante, o ato administrativo que nesse sentido foi exteriorizado configura ilegalidade lesiva de direito líquido e certo, atacável pela via do mandamus. Em caso semelhante, decidiu o STJ:
Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Candidato portador de deficiência auditiva. Reserva de vaga negada pela Administração devido à comprovação de deficiência auditiva unilateral. Matéria de Direito. Possibilidade de impetração do writ. Aplica~ção errônea da Resolução n. 17/2003 do CONADE. Lei n. 7.853/89. Decretos ns. 3.298/99 e 5.296/2004. Direito líquido e certo. Recurso Provido.
1. A matéria de que trata os autos, qual seja, saber se a surdez unilateral vem a caracterizar deficiência física ou não, é matéria de direito, que não exige dilação probatória, podendo, por conseguinte, ser objeto de mandado de segurança.
2. A reserva de vagas aos portadores de necessidades especiais, em concursos públicos, é prescrita pelo art. 37, VIII, CR/88, regulamentado pela Lei nº 7.853/89 e, esta, pelos Decretos nºs
3.298/99 e 5.296/2004.
3. Os exames periciais realizados pela Administração demonstraram que o Recorrente possui, no ouvido esquerdo, deficiência auditiva superior à média fixada pelo art. 4º, I, do Decreto nº 3.298/99, com a redação dada pelo Decreto nº 5.296/2004. Desnecessidade de a deficiência auditiva ser bilateral, podendo ser, segundo as disposições normativas, apenas, parcial.
4. Inaplicabilidade da Resolução nº 17/2003 do CONADE, por ser norma de natureza infra-legal e de hierarquia inferior à Lei nº 7.853/89, bem como aos Decretos nºs 3.298/99 e 5.296/2004.
5. Recurso ordinário provido (STJ, RMS n. 20865/ES, rel. Min. Paulo Medina, j. 3.8.2006).
DECISÃO
Ante o exposto, por unanimidade, concede-se a segurança.
O julgamento, realizado no dia 10 de dezembro de 2008, foi presidido pelo signatário, com voto, e dele participaram os Desembargadores Cláudio Barreto Dutra, Newton Trisotto, Luiz Cézar Medeiros, Vanderlei Romer, José Volpato de Souza, Rui Fortes, Cesar Abreu, Cid Goulart, Jaime Ramos, Newton Janke, Paulo Henrique Moritz da Silva e Ricardo Roesler.
Florianópolis, 16 de dezembro de 2008.
Pedro Manoel Abreu
RELATOR